PARLAMENTO EUROPEU CONTINUA
EM MUDANÇA
O dia da mudança chegou. Em uma recente noite de
sexta-feira, caixotes de mudança codificados por cores,
estavam prontos. Alguns dos 2.500 estavam empilhados
fora de cada escritório virtual pelos longos corredores
do complexo do Parlamento Europeu de Bruxelas.
Equipes de trabalho ficaram empacotando durante horas
antes de seguir para Estrasburgo, na França, a 354
quilômetros dali, tentando organizar tudo para os 736
membros do Parlamento até segunda pela manhã.
Essa proeza não foi inédita. Ela se repete todos os
meses aqui _ a cansativa e custosa viagem que está
polemizando pelo extravagante desperdício, em um momento
que a União Europeia está pedindo à Grécia e a outros
países, como Irlanda e Portugal, que cortem radicalmente
suas próprias despesas para evitar a moratória de suas
dívidas.
Espercialistas dizem que eliminar essa viagem mensal
poderia economizar US$ 258 milhões por ano. "Nós temos
um circo viajante que custa muito e produz uma enorme
quantidade de dióxido de carbono", disse Ashley Fox,
conservador britânico e membro do Parlamento Europeu que
está fazendo campanha para acabar com essa prática. "Nós
não podemos continuar com isso".
A transferência até Estrasburgo é o primeiro exemplo
de diversas contorções diplomáticas que são necessárias
para apaziguar o eleitorado europeu _ e que pareciam
mais acessíveis em épocas de abundância. Grande parte do
orçamento de 127 bilhões de euros do bloco de 27 países
europeus é repartido entre a ajuda para a agricultura ou
os subsídios para regiões pobres, e os países membros
são muito discretos em relação ao uso dessa ajuda.
Políticos direitistas da Finlândia à Itália
transformaram o desperdício do bloco em um tema de
campanha populista.
Ano passado, a Itália foi ordenada a devolver US$ 1
milhão para os fundos europeus, gastos na organização do
concerto de Elton John em Nápoles. Em junho, o
primeiro-ministro britânico David Cameron reclamou que
os líderes do bloco decidiram gastar US$ 344 milhões em
um novo prédio administrativo para eles próprios em
Bruxelas e os encorajou a reconsiderar a decisão.
"Você fica pensando se essas instituições realmente
têm consciência do que cada país e cada membro do
eleitorado está tendo de passar ao cortarem seus
orçamentos e tentarem dar sentido às suas finanças",
Cameron disse aos repórteres.
As viagens a Estrasburgo eram promovidas
principalmente pelo governo francês, que fez manobras em
1992 para preservar nos tratados europeus as plenárias
mensais em Estrasburgo.
Assim, milhares de oficiais e lobistas entram em
Estrasburgo todos os meses, enchendo os hotéis e
restaurantes. Quando o Parlamento está na cidade para as
reuniões da semana, os preços dos hotéis em Estrasburgo
competem com os de Veneza no verão.
Mas estas extravagâncias serão votadas em um próximo
escrutínio. A recente demanda de aumento de 5% ao
orçamento europeu, em um momento em que o continente
está estagnado por uma depressão econômica, foi apontada
por alguns como o extremo exemplo da surdez do
Parlamento.
Em maio, Fox, membro britânico do Parlamento Europeu,
sugeriu que o número de viagens para Estrasburgo pudesse
ser ao menos reduzido para 11 no próximo ano, ao
determinar duas sessões plenárias em uma semana. E então
ele conseguiu um voto secreto para este tema.
Com as identidades protegidas, a medida passou com
mais de 100 votos de margem. Mas os críticos não
desistiram. Outro membro britânico do Parlamento
Europeu, o liberal democrata Edward Macmillan-Scott,
recentemente divulgou um estudo fornecendo algumas
provas de que a Europa deveria gastar seu dinheiro com
mais sabedoria.
O relatório sugeria não apenas que a viagem a
Estrasburgo produzia 19 mil toneladas extras de dióxido
de carbono e gerava 300 empregos desnecessários, mas
também que ela era um desastre para a imagem do
Parlamento e para a vida dos deputados que estavam
condenados a horas extras de viagem. O relatório também
mostra que, devido à falta de quartos de hotel, que
geram lucros rotineiros ao setor de hospedagem, o
Parlamento chegou a precisar alugar um barco turístico
para acomodar seus integrantes.
O relatório de MacMillan-Scott também descobriu um
"código de silêncio" sobre o assunto. Todavia, quando
questionados reservadamente, muitos deputados
concordavam que as viagens eram um uso ineficiente do
tempo e fisicamente desgastantes.
Na verdade, há lugares piores a serem forçados a
passar uma semana do que Estrasburgo, charmosa cidade
medieval no Reno. Mas para a maioria dos deputados e
seus assistentes, só chegar a Estrasburgo já é um
suplício. Apenas seis capitais europeias têm voos
diretos para lá.
"Quando você olha para a Europa e para os problemas
financeiros gregos, para a Grã-Bretanha, Irlanda e
Portugal, eu não entendo como uma organização possa
pagar US$ 285 milhões para algo tão contraproducente",
disse McMillan-Scott "Isso nos expõe ao ridículo".
Até alguns políticos e jornalistas franceses começam
a concordar, incluindo Karima Delli, jovem deputada que
representa o Partido Verde. "Em um momento de séria
austeridade, o Parlamento precisa dar o exemplo", ela
diz. Mas o governo francês não vai se entregar
rapidamente _ e mudanças no tratado precisam ser
decisões com aprovadas por unanimidade. Eles já
mostraram vontade de lutar. Os franceses entraram com
uma ação na Corte Europeia de Justiça, tentando
restaurar a 12ª semana para Estrasburgo, no próximo ano.
O prefeito de Estrasburgo, Roland Ries, proferiu uma
insignificante ameaça sugerindo que, se Estrasburgo
fosse revisada, outros arranjos também deveriam ser
examinados. "Por que nós estamos apenas focados na
questão de Estrasburgo?", disse Ries. "Vamos discutir
todas as sedes das instituições europeias. Porque o
Banco Central Europeu é em Frankfurt?"
Mas pode ser que uma negociação esteja próxima. Os
que são a favor de apenas uma sede acreditam que a
França possa estar de acordo se for oferecida uma força
correta de compensação _ como uma nova Universidade
Europeia em Estrasburgo.
Ries rejeita este tema. "Eles estão nos oferecendo
migalhas", diz. "Estão nos desrespeitando". Instituições
europeias e agências estão espalhadas pelo continente,
um produto da história, de negociações e de alguma
lógica do momento. O Parlamento terminou em Estrasburgo
porque muitos viram um simbolismo nisto. Outra
instituição-chave, o centro administrativo do
Parlamento, está baseada em Luxemburgo, somando um novo
local para a mistura.
Gritos de desperdício têm sido um constante refrão.
Em 2002, o Parlamento já havia calculado que ter três
lugares de trabalho custava US$ 240 milhões por ano. Em
2006, quando a União Europeia embarcou em planos de
fazer-se mais responsável com os eleitores ao prometer
considerar ideias defendidas por 1 milhão de
assinaturas, o custo de mudar-se de um lado para outro
se transformou em um alvo imediato.
Anders Ekberg, antigo conselheiro político no
Parlamento que ajudou a reunir as assinaturas para parar
as mudanças, disse estar surpreso de como foi fácil
consegui-las. Elas foram reunidas em poucos meses.
Mas o esforço foi por água abaixo. A Comissão
Europeia, poder executivo do bloco, determinou que a
petição não podia ser considerada porque apenas líderes
nacionais poderiam mudar o status de Estrasburgo. Fonte
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